sexta-feira, 29 de abril de 2016

ENQUANTO O CORAL CANTAVA

Enquanto a música enchia o templo, 
eu vi o Rei. 
Vestido de majestade, coroado de honra, 
um cetro de poder e glória na mão. 
Ele voltava. 

Livre dos sapatos e dos preconceitos, 
da doença e da fadiga. 
Feliz, como uma criança que se atira 
na direção do Pai  – depois de uma ausência 
que só fez maior o amor e a necessidade 
de ver – eu corria no meio da multidão, 
que erguia palmas brancas 
em saudação Àquele que voltava. 
Lá estavam Livingstone, Carey, Bratcher, 
Corinto, Miranda Pinto... 
Lá estavam os vultos frágeis, 
Ana de Ava, Noemi Campelo, Caíta, 
Lotie Moon... 
Os missionários de todas as raças. 
Os grandes que se fizeram pequenos, 
os pequenos que a fé tornou gigantes: 
Bagby, Taylor, D. Chiquinha, 
que eu conheci 
quebrando coco babaçu, 
para sustento da obra 
que eles começaram. 
Lá estavam D. Maria e D. Carmen 
- um corpo perfeito no lugar daquele 
que a lepra deformara. 
Lá estavam Darito e os companheiros 
de enfermaria que ele levara a Cristo, 
livres do balão de oxigênio 
e do terrível clima de segregação. 
Lá estavam meus amigos cegos, 
com olhos enormes de luz 
e expectativa; 
Meus priminhos mudos, entoando, 
mais alto que todos, 
o canto de vitória e gratidão.
Livres de grades 

e de cadeiras de rodas, 
lá estavam muitos que eu conhecera 
prisioneiros da doença e do pecado. 
Lá estava meu irmão 
que Deus levou tão cedo. 
Lá estavam os mártires de todas as épocas, 
do tempo dos césares 
e das cortinas de ferro e de bambu. 
Lá estavam homens de pele escura 
e alma cor de neve; índios de brilhantes cabelos, 
crianças de todas as raças, 
cantando hosanas, como na entrada 
triunfal em Jerusalém. 
Lá estavam os meninos do Tocantins, 
os barqueiros do São Francisco, 
a gente do Araguaia, 
os colonos da Transamazônica, 
que se haviam tornado súditos 
do Caminho maior. 
Num milagre sem explicação, 
a multidão de mil cores, 
que entoava hinos em mil línguas 
e dialetos, 
era absolutamente igual, no sentimento 
que fazia de todos 
uma só corrente de alegria, 
formada por mil elos de amor. 

Eu disse que todos estavam lá? 
Não sei. Parece-me que havia lacunas 
na multidão e no coração do Rei. 
Muitos estavam ausentes, 
presos a cuidados terrenos, 
deixando a escola suprema 
para um amanhã inexistente, 
oferecendo a Momo um último holocausto, 
como se fosse possível 
servir a dois senhores, 
abraçar o mundo, sem desprezar o Rei.
E foi assim, enquanto o coral cantava, 

que pude sentir o quanto amava ao Rei, 
o quanto meu coração agradecia, 
por estar entre os salvos; 
por chamá-lo pelo nome que Madalena usou 
quando o reconheceu: 
- Voltaste, Raboni! Aleluia! 
Bem-vindo sejas, meu Senhor, meu Deus!
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Autora: MYRTES MATIAS

REFERÊNCIA:

REACHERS, Sammis. Antologia de Poesia Missionária – Volume 2. [s.n]. Versão gratuita em PDF, [2013].

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